segunda-feira, 26 de outubro de 2015

DIREITO DO TRABALHO - ORGANIZAÇÃO E DURAÇÃO TEMPORAL DO TRABALHO

A PROCURA DE MAXIMIZAÇÃO DOS LUCROS, OS HORÁRIOS DE TRABALHO E SUAS REMUNERAÇÕES – REVISTA E ACTUALIZADA

 

A

 jornada normal de trabalho é o espaço de tempo durante o qual o trabalhador deverá prestar serviço ou permanecer à disposição da entidade patronal (Empregador), com habitualidade, exceptuadas as horas extraordinárias, cuja sua duração é de 8 horas diárias ou 44 horas semanais, como dispõem as alíneas a) e b), do nº 1 do art.º 95° da L.G.T. As 44 horas semanais podem ser completadas com trabalhos a serem realizados aos sábados por um período de 4 horas que normalmente decorre entre as 8 às 12 horas, fora isto o trabalho considerar-se-á extraordinário e consequentemente remunerável.

Várias têm sido, e continuarão a existir denúncias de trabalhadores que são coagidos e obrigados a trabalharem fora dos horários normais de trabalho, sábados e domingos, sem estarem integrados nos regimes de turno e sem o respectivo pagamento da horas extras trabalhadas, sob pena de verem extinta a relação contratual caso assim não procedam.

Antes de mais importa referir aqui algumas substanciais alterações relativas ao aos horários de trabalho, regime, remunerações e período de descanso a luz da nova Lei Geral do Trabalho – Lei nº 7/15 de 15 de Junho. Desde a entrada em vigor deste novo diploma legal, os trabalhadores passaram a ter entre 45 minutos a 1 hora e 30 minutos para realização da refeição e descanso (para laboração de turno normal), e 30 minutos para os que se encontrem a trabalhar em turno rotativo[1].

            Ainda na senda dos regimes de horário de trabalho, esta lei traz-nos como inovação, a distinção dos horários de trabalhos especiais com seus conceitos, dando aqui uma clara margem de manobra ao empregador de variação de período de trabalho e quiçá também ao empregado (caso concorde o empregador) de poder ter um regime de trabalho que lhe favoreça a realização de outras actividades. Dizer que tal possibilidade de variação de regime ou horário de trabalho nunca esteve vetada às partes fruto da liberdade contratual e de estipulação das cláusulas (artigo 405 C.C), desde que se cumprisse o imperativo legal previsto no artigo 95 (duração e limite do horário de trabalho), pelo que embora previsível no antigo e actual diploma, se encontravam em prática na maior parte das grandes empresas e eram desconhecidas pelos trabalhadores em geral.

Ora, se existem “desvantagem” que devam ser referidas, nesta abordagem relativa a organização e duração temporal do trabalho (capítulo VI), então devemos maior atenção aos artigos 100⁰, nº 3 do artigo 103⁰, nº1 do artigo 109⁰, nº 1 do artigo 112⁰  e artigo 117, todos do novo diploma.

A tabela que abaixo apresentamos nos ilustra as diferenças e alterações carregadas pelo novo diploma legal (Lei nº 7/15 de 15 de Junho). Como vemos, a única diferença substancial nesta temática verifica-se para aquelas que não se enquadram no escalão das grandes empresas, pois é nestas que grande prejuízo acarretarão os trabalhadores no que tange a remuneração adicional a receber.

 
Trabalho por turno
Regime de disponibilidade
Isenção e hora. de trabalho
Trabalho extraordinário
Trabalho nocturno
Remuneração a pagar
Lei Antiga – 2/00
20% do salário base - sem distinção – art. 114
20% do salário base - sem distinção – linha e) do nº2 do art.120
Correspondente ao valor de uma hora diária do trabalho extraordinário  -  nº1 in fine do art. 110
50% do valor da hora de trabalho normal até ao limite de 30 horas/mês ou 75% caso exceda aquele – sem qualquer distinção – nº1 e 2 do art. 105
25% do salário base - sem distinção – art. 99
Lei Nova – 7/15
20%, 15%, 10%, 5% do salário base conforme se trate de grande, média, pequena e micro empresa - art. 100
20%, 15%, 10%, 5% do salário base conforme se trate de grande, média, pequena e micro empresa – nº 3 do art. 103
Correspondente ao valor auferido por cada hora normal de trabalho efectivo – nº1 do art, 109
50%, 30%, 20%, 10% desde que não exceda o limite de 30 horas/mês ou 75%, 45%, 20%, 10%  caso exceda aquele, do valor da hora de trabalho normal, conforme se trate de grande, média, pequena e micro empresa – nº 1 e 2 do art. 117
20%, 15%, 10%, 5% do salário base conforme se trate de grande, média, pequena e micro empresa – nº1 do art. 112

Acreditamos ter sido infeliz o legislador ao conceber tais remunerações[2], tendo destarte prejudicado, grosseiramente, grande parte da massa trabalhadora, visto que não são muitas as grandes empresas instaladas em Angola. Não obstante tal infelicidade, sejam elas boas ou ruins, dura lex sed lex[3].

Lembremo-nos que é expressamente proibido o trabalho obrigatório ou compulsivo, como prescreve o nº 1 do art.º 5° da L.G.T., coadjuvado com o nº 1 e as alíneas a), b), e c) do nº2 do art.º 36° da C.R.A., que o Estado Angolano na Constituição da República proíbe ainda a que um ser seja submetido a trabalhos esforçados e garante a todo trabalhador uma justa remuneração e descanso como direitos fundamentais, previstos nos art.º 60° e no nº2 do art.º 76° da C.R.A.

A Lei Geral do Trabalho e as demais disposições legais não pouparam esforços e como não podia ser diferente, foram reconhecidos vários poderes a entidade patronal e dentre eles, o Poder de organização do trabalho incluindo neste o direito de estabelecer os horários de trabalho (alínea f do nº 1 e nº 2 do art.º 36°, art.º 37° e nº 2 do art.º 92°). Não obstante isto, este poder não deve ser exercido de forma arbitrária, visto que as suas formas de exercício vêm previstas e definidas na L.G.T. Definir o tempo de trabalho é também definir os espaços de repouso e lazer que são necessários para a recomposição de energias e para a salvaguarda da integração familiar e social do trabalhador.

Os art.º 114° ss., e art.º de 92° a 128° da L.G.T., especificam em que circunstancias se deve efectuar o trabalho extraordinário e consequentemente a sua forma de remuneração, porque a prestação de trabalho não pode invadir totalmente a vida pessoal do trabalhador: é necessário que, por aplicação de normas ou por virtude de compromissos contratuais, esteja limitada a parte do trabalho na vida do indivíduo, para que se afaste qualquer semelhança com a escravatura, servidão ou exploração humana.

Para acautelar tal situação, a Constituição da República de Angola como já foi referido acima e própria Lei Geral do Trabalho dispõem de normas que garantem o devido descanso semanal ao trabalhador por se tratar de um direito fundamental que tem como corolário a garantia da integridade física e mental do cidadão. É ainda dever do empregador cumprir todas as demais obrigações legais relacionadas com a organização e prestação do trabalho (alínea j) do art.º 41°, art.º 37° in fine).

Mas não basta dizer que existem horários e normas e que são imperativas, pois o homem ainda dispõe, mesmo que patente o carácter imperativo e coercivo das normas jurídicas, de um livre arbítrio que lhe permite independentemente das consequências, optar entre o fazer e o não fazer. Para tal, e como não podia deixar de ser, o legislador de forma a garantir o mínimo de segurança jurídica criou e atribuiu competências de fiscalização à Inspecção Geral do Trabalho (IGT). Este órgão, dependente do Ministério da Administração Pública, Trabalho e Segurança Social tem a competência de fiscalizar e sancionar quaisquer empresas que violem e atropelem as normas laborais vigentes, para além dos recursos aos tribunais junto da sala de Trabalho dos Tribunais Provinciais.

As competências deste órgão vêm consagradas no seu regulamento - Decreto Nº 9/95 de 21 de Abril, Regulamento da Inspecção Geral do Trabalho - De acordo com os artigos 2, 3 e 4 do Decreto Nº 9/95 de 21 de Abril – Regulamento da Inspecção Geral do Trabalho, invocando os artigos 13, 15 e 25 do mesmo diploma legal, coadjuvados com os artigos 8, 32e seguintes, 40 e 41 do Decreto Nº 11/03 de 11 de Março (decreto que estabelece o regime das multas, por contravenção ao disposto na Lei nº 7/15 de 15 de Junho – Lei Geral do Trabalho, e legislação complementar), pode qualquer trabalhador apresentar queixa junto da Inspecção Geral do Trabalho, ver seu direito salvaguardado e a entidade patronal sancionada.

EXISTE APENAS UMA

MANEIRA DE GARANTIR

A MANUTENÇÃO E A

SALVAGUARDA DE UM

DIREITO: O SEU EXERCÍCIO

 



[1] A Lei geral de trabalho revogada – Lei nº 2/00- definia para descanso e refeição um período mínimo de uma hora  e um máximo de duas horas para o regime normal, embora tenha mantido inalterável o período relativo ao regime de trabalho ou por turno. Vide nº 1 do artigo 97⁰  e nº 2 do artigo 113⁰.
[2] Pode-se entender ter havido violação ao princípio da igualdade de tratamento, que por sinal constitucionalmente garantido, se estivermos diante trabalhos idênticos, funções idênticas, mesmas qualificação profissional e académica, mas em diferentes empresas (grande e micro por exemplo). Será que tal fundamentação é valida? Deixarei então este exercício para os demais…
[3] Brocardo latino – significando : Lei é dura, porém é Lei ou mais extensivamente: por mais dura que seja, Lei sempre será Lei portando deve ser cumprida seja ou não do nosso agrado.

Sem comentários:

Enviar um comentário